Atividade física e saúde tratados de forma simples e irreverente

Frase da semana: "Obstáculos são aqueles perigos que você vê quando tira os olhos de seu objetivo."
( Henry Ford )


sábado, 27 de outubro de 2007

Remédios para emagrecer

Entrevista que o Dr. Drauzio Varella realiza com o Dr. Márcio Mancini, de suma importância para o melhor entendimento para os interessados no tema em discussão.




Dr. Márcio Mancini é médico endocrinologista, membro do Departamento de Endocrinologia do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo e da ABESO (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade).







A obesidade tem-se tornado um problema cada vez mais sério de saúde, não apenas nos países desenvolvidos com fartura de alimentos, mas também nos países pobres. Para dar uma idéia grosseira da dimensão do que está acontecendo na cidade de São Paulo, pesquisa da Secretaria de Saúde publicada recentemente mostrou que, nos últimos quatorze anos, dobrou o número de homens obesos e aumentou em 65% o de mulheres obesas.
A obesidade traz consigo uma série de distúrbios clínicos, às vezes, muito graves. D
iabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares e osteoarticulares, além de diversos tipos de câncer, são alguns deles. Para evitá-los, o ideal seria que nos alimentássemos com parcimônia e adotássemos um programa regular de atividade física, mas as exigências da vida moderna acenam no sentido oposto: estamos cada vez mais sedentários e contando com maior disponibilidade de alimentos.
Quando a pessoa não consegue perder peso às custas de mudanças no estilo de vida e do controle alimentar, o uso de alguns medicamentos pode ser recomendado. No entanto, eles devem ser prescritos por médicos capazes de avaliar a relação risco-benefício, uma vez que a tolerância a essas drogas varia muito.


Ação dos medicamentos


Drauzio
Como agem os remédios usados para emagrecer?
Márcio Mancini – Os remédios podem auxiliar no emagrecimento de três maneiras:
ajudando o indivíduo a comer menos, aumentando o gasto calórico ou diminuindo a absorção de nutrientes. Atualmente, podemos encontrar no mercado remédios que diminuem o apetite, os anorexígenos, e remédios que aumentam a saciedade, o que parece a mesma coisa, mas não é. Anfepramona, femproporex, mazindol são exemplos dos anorexígenos; a sibutramina, dos que interferem na saciedade. Já o orlistat diminui a absorção de gordura e age somente nos intestinos. Embora os anorexígenos tenham pequena ação sobre o aumento de gasto calórico, não existe ainda nenhum medicamento que tenha especificamente esse efeito.

DrauzioO orlistat não permite que a gordura que comemos seja absorvida pelo organismo?
Márcio Mancini – Ele faz com que 1/3 da gordura que está nos alimentos seja eliminada pelas fezes. Os outros 2/3 são absorvidos normalmente.

Drauzio Você se referiu a remédios que tiram a fome, os anorexígenos, e a remé
dios que aumentam a saciedade, os sacietógenos, e disse que há uma diferença conceitual entre um e outro. Qual é essa diferença?
Márcio Mancini – Fome é uma sensação que precede o ato de comer; a saciedade ocorre à medida que nos alimentamos. Remédios que tiram a fome podem fazer com que a pessoa nem comece a comer, pule refeições e não é isso que se deseja.
Remédios que aumentam a saciedade não interferem na fome nem na vontade de comer, mas fazem com que o indivíduo não consiga chegar ao final do prato, porque se sente saciado mais precocemente.

DrauzioNo tratamento da obesidade, podemos contar com remédios que tiram o apetite, com remédios que estimulam a saciedade e com os que diminuem a absorção dos nutrientes. Na prática, porém, ainda não estão disponíveis remédios eficazes para aument
ar o gasto calórico. Se pensarmos bem, temos poucas armas para tratar de uma doença tão grave quanto a obesidade?
Márcio Mancini – São essas as armas farmacológicas de que dispomos para tratamento dos obesos e, mesmo tomando esses remédios, nem sempre eles respondem como se desejava. O tratamento da obesidade requer também a correção de certos hábitos (o sedentarismo, por exemplo) e a escolha dos alimentos adequados. Há quem tome os remédios, coma pouco e não emagreça porque não eliminou frituras e outros alimentos calóricos da dieta. Na adianta prescrever remédios sem o suporte da orientação nutricional adequada e do aumento da atividade física.


Indicação clínica


Drauzio
Quando os medicamentos contra a obesidade têm indicação clínica?

Márcio Mancini – Considera-se que um indivíduo é portador de uma doença chamada obesidade, quando seu índice de massa corporal (IMC) é superior a 30. Entretanto, como em qualquer área da medicina – e isso vale para a obesidade também -, é sempre preferível tratar sem recorrer ao uso de medicamentos.

Drauzio IMC de 18,5 a 24,9 é considerado normal. Entre 25 e 29,9, indica sobrepeso; de 30 a 34,9, obesidade grau 1; de 35 a 39,9, obesidade grau 2 e acima de 40, obesidade grave ou grau 3. Você poderia lembrar como se obtém o índice de massa corporal?
Márcio Mancini – Para obter o IMC (índice de massa corporal), divide-se o peso em quilos pela altura elevada ao quadrado. Existe outra maneira de chegar a esse dado: divide-se
o peso pela altura e o resultado obtido divide-se novamente pela altura.
Por exemplo: um indivíduo de 1,70m com 70kg tem IMC igual a 24,2 e está dentro da faixa de normalidade; com 75kg (IMC=26), estará com sobrepeso e, com 88kg (IMC = 30,5), será considerado obeso grau 1.

Drauzio – Remédios para emagrecer só têm indicação para pessoas com IMC acima de 30 ou podem ser prescritos também quando as pessoas se enquandram na faixa do sobrepeso?
Márcio Mancini –Remédios para emagrecer só devem ser indicados nos casos de obesidade e quando a tentativa de corrigir os hábitos alimentares e aumentar a atividade física sem tratamento farmacológico não deu resultado, pois alguns medicamentos podem apresentar efeitos colaterais indesejáveis.
Eles não devem ser prescritos para pessoas com dois ou três quilos a mais, quando o problema é meramente estético e pode ser corrigido por pequena alteração nos hábitos do dia-a-dia. No entanto, podem ser indicados se houver alguma doença associada ao sobrepeso que vai melho
rar com a perda de peso.


Efeitos adversos


Drauzio Quais são os efeitos indesejáveis dos remédios para emagrecer?
Márcio Mancini - O grupo de anorexígenos (anfepramona, femproporex e mazindol) provoca mais ou menos os mesmos efeitos colaterais. São efeitos decorrentes do estímulo do sistema nervoso central - irritação, insônia ou sono superficial, tremores – ou do estímulo
do sistema cardiovascular: hipertensão e taquicardia, por exemplo.
Às vezes, algumas pessoas manifestam irritabilidade e depressão, ou alternam períodos de em que se sentem estimuladas e deprimidas, mas isso não é comum se forem observadas as doses convencionais dos medicamentos.

Drauzio Esses remédios induzem dependência?
Márcio Mancini – Na prática clínica, não é comum encontrar casos de dependência ligados ao uso desses medicamentos, mas ela pode ocorrer. Alguns pacientes criam tolerância aos anorexígenos e aumentam progressivamente as doses de tal forma que chegam a triplicar a dose máxima preconizada para o remédio.
No entanto, o fato de a pessoa que emagreceu querer continuar tomando determinada fórmula para permanecer com peso baixo não pode ser encarado como sinal de dependência.

Drauzio Qual são os efeitos adversos dos remédios que agem no centro de saciedade?
Márcio Mancini – Os sacietógenos, isto é, os remédios que agem no centro de saciedade e são representados pela sibutramina, têm efeitos colaterais que lembram os dos anorexígenos, mas bem mais suaves. Algumas pessoas apresentam sono superficial e sentem um pouco de agitação, mas a irritabilidade não é um sintoma freqüente. Não se observa também aumento da pressão arterial quando o medicamento, associado à dieta correta, induz a perda de peso. Em geral, esses medicamentos ajudam os hipertensos a perder peso, o que faz abaixar a pressão.
Além da sibutramina, antidepressivos como a fluoxetina e a sertralina agem sobre a saciedade. Todavia, eles não são considerados remédios contra a obesidade, porque o efeito benéfico para a perda de peso desaparece após os seis primeiros meses de uso dos medicamentos. Todavia, em casos selecionados, quando o indivíduo apresenta depressão ou compulsão ligada à depressão, esses antidepressivos podem ser úteis para aumentar a sensação de saciedade.

Drauzio Você poderia falar sobre os efeitos colaterais dos remédios que diminuem a absorção de gorduras?
Márcio Mancini – O orlistat é um medicamento que não é absorvido pelo organismo. Seu único efeito colateral é inerente à própria ação do remédio, ou seja, à perda de gordura pelas fezes. Se ingerir alimento com alto teor de gordura, o paciente terá uma diarréia muito forte porque o orlistat diminui a consistência das fezes.
Na verdade, esse remédio deve ser associado a uma dieta pobre em gorduras. Tomado nas refeições, faz com que a pessoa elimine gotas de gordura a cada evacuação, o que representará perda de peso no final do mês.


Fórmulas


Drauzio
Muitas prescrições de medicamentos para emagrecer são formulações que associam várias substâncias: femproporex para reduzir o apetite, furosemida que é um diurético, remédios para ativar o funcionamento da tireóide e para aumentar a saciedade, laxantes. Como a medicina vê essas fórmulas?
Márcio Mancini – Às vezes, essas fórmulas incluem propranolol, porque a pessoa pode ter taquicardia, e potássio para repor o que perde por estar tomando diurético. Na realidade, há formulações que chegam a associar 15, 20, 30 itens diferentes.
A medicina é totalmente contrária a esse tipo de abordagem e a Anvisa proíbe a associação de medicamentos numa única cápsula. Infelizmente, muitos médicos descobriram uma estratégia que permite driblar esse regulamento: fazem três ou quatro receitas diferentes, embora a prescrição simultânea também seja proibida pela Anvisa.

Drauzio Você poderia explicar a ação das substâncias que compõem essas fórmulas?
Márcio Mancini - Na verdade, nem se conhece direito o que a associação desses medicamentos pode provocar no organismo. O furosemida, por exemplo, é indicado para pessoas com uma síndrome que justifique o inchaço, e a perda de peso que acarreta é falsa, porque o indivíduo perde água e não gordura. O hormônio da tireóide pode aumentar a queima de massa gorda, mas também queima massa magra, músculos e, a longo prazo, pode levar à perda de massa óssea. O exame de densitometria de mulheres que tomaram hormônios para tireóide durante anos para emagrecer revelou perda óssea muito maior do que o aceitável para a idade. Além disso, associação de hormônio para tireóide e anorexígenos aumenta a probabilidade da ocorrência de taquicardia e arritmias cardíacas. O hormônio para tireóide só deve ser prescrito nos casos de hipotireoidismo, via de regra, sob a forma de medicamentos fabricados por laboratórios e vendidos nas drogarias.
Resumindo: não se considera boa prática da medicina a associação simultânea desses medicamentos, assim como não é boa prática associar dois anorexígenos, mesmo que tomados em horários diferentes, o femproporex à tarde e a anfepramona de manhã, por exemplo.

DrauzioUm conceito popular atribui o ganho de peso à tireóide preguiçosa, que funciona devagar, embora raramente a obesidade possa ser explicada pelo mau funcionamento da tireóide. De onde vem essa noção?
Márcio Mancini – Um dos sintomas do hipotireoidismo é o ganho de peso que pode ser explicado pela formação de um edema característico dessa doença, o mixedema. Em geral, o ganho se limita a 3kg, 4kg, 5kg no máximo e reverte com o tratamento.
Como o endocrinologista trata de pessoas com problemas na tireóide e de pessoas que querem emagrecer, antigamente, o hormônio da tireóide era utilizado nos dois casos. Para ter uma idéia, quando fiz residência médica, há quinze anos, obesidade não era um tema discutido em aula e o tratamento era feito com formulações que incluíam o hormônio da tireóide. Daquela época para cá, essa área da medicina desenvolveu muito, inúmeras teses científicas foram publicadas e o hormônio da tireóide foi retirado das prescrições porque podia causar mais mal do que bem ao indivíduo com funcionamento normal da tireóide, que queria emagrecer.

Drauzio Tive a oportunidade de ver dois ou três casos de meninas que, na ânsia de emagrecer, tomaram formulações em doses elevadas, não sei se por dependência química ou por vontade de perder mais peso. Esse pacote de medicamentos induziu um hipertireoidismo gravíssimo que levou à perda de musculatura e as deixou esqueléticas. Como você vê, a longo prazo, as conseqüências de tomar tantos remédios ao mesmo tempo?
Márcio Mancini – É uma coisa extremamente perigosa que coloca em risco a vida da pessoa. Muitas vezes, recebemos pacientes com nível de potássio baixo no sangue, com taquicardia grave e meninas com IMC inferior a 18,5 que querem tomar essas formulações para perderem mais peso ainda.

Drauzio - E pensar que, na maioria das vezes, essas formulações são prescritas por médicos...
Márcio Mancini – São prescritas por médicos, muitas vezes, depois de uma avaliação superficial do paciente. Temos notícia de clínicas populares em que os médicos atendem as pessoas em poucos minutos, não levantam direito seu histórico, não as examinam corretamente, não pedem exames complementares e emitem receitas sem nenhum critério para a escolha das substâncias que compõem as fórmulas. O paciente não sabe que está tomando vários medicamentos numa única cápsula, nem quais são seus efeitos colaterais, nem por quanto tempo o tratamento deve ser mantido.

Drauzio Por quanto tempo o tratamento para a obesidade com medicamentos escolhidos segundo critérios científicos pode ser mantido?
Márcio Mancini – Esse ainda é um tema controverso, motivo de muita discussão nos congressos internacionais. Na bula dos anorexígenos, está escrito que o medicamento deve ser tomado por poucas semanas, no máximo, por três meses. A obesidade, porém, é uma doença como diabetes e hipertensão, que recidiva se o tratamento for suspenso, porque o paciente não consegue manter os mesmos hábitos sem os medicamentos. Por isso, é intensa a busca de agentes farmacológicos que possam ser utilizados por longos períodos e ajudem a manter o novo peso (perda de 10% é considerada muito útil para a saúde como um todo).
Dentre os remédios para emagrecer, apenas têm acompanhamento de uso contínuo mostrando segurança a sibutramina (dois anos) e o orlistat (quatro anos). Se o paciente não se adaptou bem a esses dois medicamentos, mas teve boa resposta ao fremporex ou ao mazindol, pode utilizá-los por mais tempo desde que seja acompanhado de perto pelo médico e não tenha manifestado efeitos colaterais.
Portanto, a tendência atual é indicar o tratamento com uma droga única (e não com associação de medicamentos) por um período maior de tempo, como acontece nos casos de hipertensão, diabetes ou colesterol elevado e para evitar que o paciente recupere o peso, desde que o acompanhamento médico não seja interrompido.

Site
www.abeso.org.br


Fonte: http://drauziovarella.ig.com.br/entrevistas/remedioemagrecer4.asp

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